Trecho da palestra com estudantes – 19/01/1954

Gostaria de falar, esta manhã, sobre algo que pode ser bastante difícil, mas acho que vale a pena entender isso. Muito poucos de nós desfrutam de alguma coisa. Temos muito pouca alegria em ver o pôr do sol, a lua cheia, uma bela pessoa, uma bela árvore, um pássaro voando ou uma dança. Nós realmente não desfrutamos de nada. Nós olhamos para isso, nos divertimos ou aproveitamos superficialmente disso, temos uma sensação que chamamos de alegria. Mas a alegria é algo muito mais profundo que deve ser compreendido e aprofundado. 

 Quando somos jovens, desfrutamos e deleitamos as coisas – jogos, roupas, na leitura de um livro ou na escrita de um poema, na pintura de um quadro ou empurrar um ao outro. Mas, à medida que envelhecemos, esse desfrute se torna uma dor, um esforço, uma luta. Enquanto somos jovens, desfrutamos a comida, mas à medida que envelhecemos começamos a comer alimentos fortemente carregados de condimentos, especiarias, e então perdemos todo o sabor, a delicadeza e o refinamento do paladar. Quando somos jovens, gostamos de observar animais, insetos, pássaros. À medida que envelhecemos, embora ainda queiramos desfrutar das coisas, o melhor de nós se foi, preferimos outros tipos de sensações – paixão, luxúria, poder, posição. Essas são todas as coisas normais da vida, embora sejam superficiais. Elas não devem ser condenadas, não devem ser justificadas, mas devem ser compreendidas e colocadas em seu devido lugar. Se você as condena como sendo inúteis, sensacionais, como sendo estúpidas ou não-espirituais, você destrói todo o processo de viver. É como dizer: “Meu braço direito é feio, vou cortá-lo”. Somos feitos por todas essas coisas, temos que entender tudo, não condenar, não justificar. 

 À medida que envelhecemos, as coisas da vida perdem o sentido, nossas mentes ficam embotadas, insensíveis e assim por diante. Tentamos desfrutar, tentamos nos forçar a olhar para quadros, árvores, olhar as crianças brincando. Lemos algum livro sagrado ou outro e tentamos encontrar seu sentido, sua profundidade, seu significado, mas tudo isso é um esforço, uma labuta, algo com o qual lutar. 

 Acho muito importante entender essa coisa chamada “alegria”, o desfrutar das coisas. Quando você vê alguma coisa muito bonita, você quer possui-la, segurá-la, você quer chamá-la de seu: “É minha árvore, meu pássaro, minha casa, meu marido, minha esposa”. Nós queremos segurá-la e, nesse mesmo processo de segurar, a coisa que você desfrutou se foi, pois no próprio segurar há dependência, medo, há exclusão e então a coisa que dava alegria, uma sensação de beleza interior, é perdida e a vida se torna fechada. Você considera a coisa como sendo pertencente a você, de modo que gradualmente o desfrutar se torna algo que você pode possuir, que você deve ter. Você gosta de fazer um ritual, fazer puja ou de ser alguém no mundo, você se contenta em viver na superfície, buscando uma sensação, um prazer atrás do outro. Essa é a nossa vida, não é? Você se cansa de um Deus e quer encontrar outro. Você muda o seu guru, se ele não o satisfaz, e então lhe diz: “Por favor, me leve a algum lugar”. Por trás de tudo isso está a busca por alegria. Você vive em um nível superficial e acha que pode ter alegria com isso. 

 Para conhecer a verdadeira alegria é preciso ir muito mais fundo. A alegria não é mera sensação. Ela requer um refinamento extraordinário da mente, mas não o refinamento do ego que reúne cada vez mais para si mesmo. Tal ego, tal pessoa nunca pode compreender esse estado de alegria no qual o desfrutador não está. É preciso entender essa coisa extraordinária, caso contrário a vida se torna muito pequena, mesquinha, superficial – nascer, aprender algumas coisas, sofrer, ter filhos, ter responsabilidades, ganhar dinheiro, ter um pouco de diversão intelectual e depois morrer. Essa é a nossa vida. Há muito pouco refinamento nas roupas, nas maneiras, nas coisas que comemos. Então, gradualmente, a mente se torna muito embotada.