1ª palestra pública

Rajghat, Índia  

Krishnamurti: Está tudo certo? Espero que todos vocês possam ouvir.

Eu me pergunto por que todos vocês estão aqui. Se alguém fizesse essa pergunta com seriedade, qual seria sua resposta? Por que todos estamos reunidos aqui nas margens do Ganges? É claro, rio sagrado, portanto, parcialmente por essa razão, você está aqui. E eu me pergunto que outros motivos você tem para vir e ouvir essa pessoa. É apenas reputação? É simplesmente porque você já ouviu esse homem falar várias vezes antes, então você vem e ouve? Qual a relação entre o que ele diz com o que você faz? Você entendeu minha pergunta? Qual é a relação entre o que ele diz e o que você faz? São duas coisas separadas? Ou você apenas ouve o que ele tem a dizer e continua com sua vida diária? Você entendeu nossa pergunta?

Então, nós dois vamos conversar juntos, não sobre alguns problemas teóricos abstratos, mas vamos conversar juntos, como dois velhos amigos sentados sob essas árvores sobre a nossa vida diária, o que é muito mais importante do que alguns problemas teóricos abstratos. Talvez falemos sobre eles mais tarde. Assim, devemos nós, como dois velhos amigos, falar sobre os nossos problemas. Temos tantos problemas: como meditar, que guru seguir se você for um seguidor, que tipo de prática você deve fazer, que tipo de atividade diária você deve realizar e assim por diante. E qual é a nossa relação com a natureza? Todas as árvores, os rios, as montanhas, as planícies e os vales – qual é a nossa relação com a natureza? Com uma árvore, uma flor, um pássaro que passa… E qual é a nossa relação um com o outro, não com o orador, mas um com o outro, com sua esposa, com seu marido, seus filhos, com todo o ambiente, como o governo, vizinhos, comunidade e assim por diante? Qual é a nossa relação com tudo isso? Ou estamos tão isolados, tão preocupados com nós mesmos, tão intensamente interessados em nosso próprio modo de vida? Estamos lhe fazendo todas essas perguntas. Portanto, como dois amigos – o orador diz como amigos, não como um guru. Você já teve gurus suficientes neste país. Eles realmente não valem a pena. E o orador não tem qualquer intenção de impressioná-lo, de lhe dizer o que fazer ou de ajudá-lo. Por favor, tenha isto em mente durante as conversações: ele não tem nenhuma intenção de ajudá-lo. Eu vou lhe dizer o porquê, a razão, a lógica disso.

Você já teve muitos gurus, milhares deles, muitos ajudantes – ajudantes cristãos, hindus, budistas, todo tipo de líder, não apenas politicamente, mas também “religiosamente”. Não sei o que essa palavra significa no momento, então entraremos nessa palavra. E você já teve líderes do maior e do menor tipo, e onde você está no final desta longa evolução de dois milhões de anos? Onde você está? Onde estamos nós, você e todos aqui? Supõe-se que vivemos nesta Terra por dois milhões e meio de anos e, durante essa longa revolução e evolução, ainda permanecemos bárbaros. Podemos ser mais limpos, com comunicação mais rápida, melhor higiene, transporte e assim por diante, mas moralmente, eticamente, se me permitem usar essa palavra, espiritualmente ainda somos bárbaros. Nós nos matamos não apenas na guerra, mas também em nossas palavras, em um gesto. Somos muito competitivos. Estou falando comigo mesmo ou estamos juntos nisso? Somos muito ambiciosos. Cada um está preocupado consigo mesmo, interesse próprio. Esta é a nota dominante em nossa vida: interesse próprio. Preocupado com o próprio bem-estar, segurança, posição, poder e assim por diante. Não estamos preocupados com nós mesmos? Espiritualmente, religiosamente, negócios e assim por diante. Cada um em todo o mundo, seja russo, americano ou europeu, e assim por diante, estamos todos preocupados com nós mesmos. Isso significa nos isolar do resto da humanidade. Isso é um fato. Não estamos exagerando. Não estamos dizendo algo que não é verdade. Aonde quer que você vá – o orador já esteve no mundo todo em um determinado momento e ainda circula. Alguns de vocês percorreram um longo caminho, assim como o orador, um caminho muito longo, e quando você dá a volta ao redor do mundo e vê o que está acontecendo – aumento de armamentos, violência, fanatismo, o grande e profundo sentimento de insegurança, incerteza e a sensação de separação: “você” e “eu”. Certo?

Essa é a nota comum da humanidade. Por favor, estamos diante de fatos e não de teorias, não de algum tipo de afirmação distante, teórica, filosófica. Estamos olhando para os fatos, não meus fatos em oposição aos seus fatos – fatos. Todos os países do mundo, como vocês devem conhecer, estão reunindo armamentos – todos os países, sejam pobres ou ricos. Certo? Olhe para o seu próprio país: imensa pobreza, desordem, corrupção. Todos vocês sabem disso – e coleta de armamentos. Costumava ser um golpe para poder matar o outro, agora você pode vaporizar a humanidade aos milhões com uma bomba atômica ou bomba de nêutrons. Temos desde o golpe, flecha e assim por diante, até termos a bomba atômica. E nós progredimos imensamente tecnologicamente – uma revolução está acontecendo, da qual sabemos muito pouco. O processo tecnológico é tão rápido, que da noite para o dia já terminou – algo novo. E, eticamente, somos o que fomos durante um milhão de anos. Você entendeu o contraste? Tecnologicamente, como o computador que pode superar o homem, ele pode inventar novas meditações, novos Deuses, novas teorias. Estávamos conversando outro dia com três ou quatro profissionais de informática muito importantes. O computador pode pensar para trás e para frente, o que é chamado de “arquitetura”. Não vou entrar nisso no momento. E essa quinta ou sexta geração de computadores é tão rápida, tão extraordinariamente capaz – ele pode inventar, produzir, mudar e assim por diante. Eu não vou entrar em tudo isso com você.

E o homem, isto é, você e eu, o que vai acontecer com nossos cérebros? Você entendeu o que estou dizendo? Se o computador pode fazer quase tudo – é claro que há sexo ou olhar para a lua nova – ele pode fazer quase tudo que os seres humanos fazem. Isso não é uma teoria, está acontecendo agora. Então, o que vai acontecer com você? O que vai acontecer conosco como seres humanos? Queremos entretenimento, provavelmente isto faz parte da sua ideia de entretenimento: vir aqui, sentar-se, ouvir, concordar ou discordar e voltar para casa, continuar com sua própria vida. Isso faz parte do entretenimento, como ir à igreja, templo, mesquita ou futebol, críquete neste país. Por favor, isto não é um entretenimento. Você e o orador devem pensar juntos, não apenas sentar-se em silêncio e absorver alguma atmosfera estranha, algum punyam. Desculpe, não é nada disso. Vamos de forma sã, lógica, pensar juntos, olhar para a mesma coisa, juntos. Não como você olha e eu olho, mas juntos observar, não apenas a nossa vida diária, que é muito mais importante do que qualquer outra coisa. Nosso dia, cada minuto do nosso dia. Então, primeiro vamos pensar juntos, não apenas ouvir, concordar ou discordar, o que é muito fácil. Desejamos fortemente se podemos deixar de lado o acordo e o desacordo. Isso é muito difícil para a maioria das pessoas. Somos muito ansiosos para concordar ou discordar. Nossas reações são muito rápidas. Nós classificamos tudo – homem religioso, homem irreligioso, mundano e assim por diante.

Se você puder, pelo menos esta manhã, deixar de lado completamente o acordo, desacordo e simplesmente observar juntos, pensar juntos. Você vai fazer isso? Ponha de lado completamente a sua opinião e a minha opinião, a sua maneira de pensar e a maneira de pensar da outra pessoa. Podemos fazer isso? Apenas por uma hora. Não se preocupe. Não demore muito para decidir. Porque a concordância e a discordância dividem as pessoas. É ilógico dizer: “Sim, eu concordo com você”. Ou falar: “Eu não concordo com você”. O que significa que você está projetando, se apegando à sua opinião, ao seu julgamento, à sua avaliação. Ou você discorda, fala: “Sinto muito, eu não concordo com você”, o que é outra forma de interesse pessoal e de descarte. Poderíamos fazer isso esta manhã apenas por diversão? Apenas por diversão ou entretenimento, se você quiser. Esquecer nossas opiniões, julgamentos, nosso acordo ou desacordo, apenas para ter um cérebro claro, não devocional, emocional ou romântico, mas um cérebro que pensa claramente se isso for possível. Um cérebro que não se envolve em todas as complicações da teoria, opinião, aceitação, rejeição. Podemos fazer isso? Provavelmente, você nunca fez isso. Portanto, vamos prosseguir.

O que é pensamento? Todo ser humano no mundo, todos, desde o mais ignorante, o mais bruto, desde a pessoa muito, muito pequena em uma pequena aldeia à até o cientista mais sofisticado, eles têm algo em comum. Você não percebeu? Pensamento. Eles pensam – o aldeão que nunca leu nada, nunca foi a uma escola, faculdade, universidade, mas provavelmente a maioria de vocês aqui foram educados. Certo? Então, você pensa e o aldeão pensa. Certo? O homem que se senta sozinho no Himalaia, ele também pensa. Então, todo ser humano no mundo pensa. Certo? E esse pensamento está correto desde o início dos tempos.

Portanto, devemos fazer a primeira pergunta – já que faremos várias perguntas – o que é pensar? O que é isso, sobre o que você pensa? O que é pensar? Certo? Você vai responder a essa pergunta primeiro? Não a partir de livros. Certo? Não a partir do que diz o gita, upanishads, bíblia ou o alcorão. O que é pensar? Senhor, quando você vai para a faculdade, escola até a universidade e você é um burocrata, ministro-chefe, primeiro-ministro ou o mais baixo dos aldeões, todos eles têm algo em comum. Além de muitas outras coisas que examinaremos – o que é pensar? Vivemos a partir do pensamento. Nossa ação diária é baseada no pensamento. A menos que questionemos, resolvamos e nos agarremos a isso – descubra. Quer você seja um físico, um trabalhador ou qualquer tipo de ser humano nesta Terra, todos nós pensamos. Você pode pensar de uma maneira e o outro pode pensar de outra maneira, mas ainda é pensamento. Certo? Então, o que é isso? Você consegue pensar se não tiver memória? Se você não consegue pensar para trás e para frente, o que você fará amanhã, na próxima hora, o que você fez ontem ou hoje de manhã. Você pode pensar para frente e para trás. Isso é chamado, tecnologicamente no mundo da informática de “arquitetura”. E os computadores podem fazer isso. Portanto, vocês devem descobrir juntos, não o modo de pensar indiano e o modo de pensar europeu. Eu não sei se você está seguindo o que o orador está dizendo – o modo de pensar oriental, que é o budista, o hindu, o muçulmano, o cristão e todas as seitas. Certo?

Então, o que é pensar? Diga-me, por favor. O que é pensar? Por que você pensa? Você está perplexo? Nenhuma resposta? Você vai discutir comigo amanhã, eu acredito, ou depois de amanhã. Vamos ter um diálogo juntos. A menos que você realmente entenda o processo de pensar, a menos que você realmente o compreenda, nossa vida sempre será muito, muito limitada. Portanto, devemos examinar muito profundamente, seriamente, como um físico, como um cientista examina, devemos investigar muito, muito de perto todo esse processo de pensamento que molda a nossa vida. O homem criou Deus a partir do seu pensamento. Deus não criou o homem. Deve ser um Deus muito, muito pobre que criou esses seres humanos que estão lutando uns contra os outros perpetuamente. Ele deve ser um velho Deus bastante bobo. Então, o que é pensar? E por que criamos problemas com isso? Certo? Temos problemas sobre pensar. Portanto, também devemos examinar atentamente por que temos problemas. Você entendeu? Estamos juntos nisso um pouco, pelo menos, seguindo um ao outro ou todos vocês já foram dormir?

Então, primeiro, por que temos problemas na vida? O que é um problema? Temos muitos deles: problemas políticos, financeiros, econômicos, os problemas de uma religião contra a outra, os problemas de – oh! Você entendeu? Você não tem problemas aos milhares? O que é um problema? E o significado da palavra “problema”, o que isso significa? O significado. De acordo com o dicionário, isso significa algo atirado em você, um desafio, algo que você tem que olhar, enfrentar. Isso é o que significa um problema. Certo? Estamos juntos nisto ou estou falando comigo mesmo? Portanto, primeiro, a palavra “problema” significa algo atirado em você. Não se pode desviar, fugir, suprimir isso. Ele está lá, como um polegar machucado. Por que é que toda nossa vida, desde o momento em que nascemos até a nossa morte temos problemas? Sobre a morte, sobre o medo, sobre uma centena de coisas. Certo? Você está fazendo essa pergunta ou eu que estou fazendo para você? Você não parece reagir a tudo isso. A partir do momento em que você nasce, depois de um tempo, depois de vários anos, você vai à escola. Lá você tem que ler, escrever. Isso se torna um problema para a criança. Certo? E mais tarde ela tem que aprender matemática – pobre criança – e isso se torna um problema. E a mãe diz: “Não faça, faça isso, não faça aquilo”, e isso se torna um problema. Certo? Portanto, desde a infância somos criados em problemas. Certo? Estou dizendo algo estranho? Vocês todos parecem terrivelmente sérios! (Risos) Desculpe por usar essa palavra, mas você parece muito sério! Provavelmente, só esta manhã… Assim, desde a infância, cultivamos um milhão de problemas. Nosso cérebro está condicionado a problemas. Ele nunca está livre de problemas. À medida que você cresce, torna-se adolescente, sexo, como ganhar dinheiro, o que fazer, seguir a sociedade ou não, revoltar-se ou não e no final você se entrega à sociedade, ao ambiente. Portanto, tudo isso se torna um problema.

Todo político no mundo resolve um problema e, portanto, cria outro problema. Você não percebeu tudo isso? Então, o cérebro humano que está dentro do crânio, por si só tem um problema. Você entendeu? Portanto, pode o cérebro ficar livre de problemas para resolver os problemas? Você entendeu minha pergunta? Se o cérebro não está livre de problemas, então como ele pode resolver qualquer problema? Você entendeu? Isso é lógica. Certo? Assim, pode o cérebro, o seu cérebro, aquilo que está dentro do crânio que carrega as memórias – não vou entrar em todos os detalhes – que adquiriu um tremendo conhecimento, esse cérebro que foi nutrido, educado para ter problemas. Certo? Então, estamos perguntando agora: o cérebro, seu cérebro, pode alguma vez ficar livre de problemas para então resolver os problemas? Isso é lógica. Certo? Portanto, você pode se livrar dos problemas primeiro? Ou isso é impossível? Você entendeu minha pergunta? Nosso cérebro é condicionado como hindus e nas várias divisões do hinduísmo. Nós somos – o cérebro é condicionado como budista, monge, o cérebro é condicionado nas várias religiões estreitas, o cérebro é condicionado pela especialização. Oh, senhor! Você não está interessado em tudo isso? Estou me perguntando, olhando para você – você não está interessado em tudo isso? Ou é o hábito de ir a uma reunião, ouvir e dizer: “Sim, está bem, está bem”. Vocês são engraçados, tudo bem.

Então, vamos começar. Nosso cérebro é condicionado pelo ambiente em que vivemos, por sua educação, religião, por sua pobreza ou riqueza. Vocês fizeram votos como monges, não sei por que, mas vocês os fizeram – e isso se torna uma tortura, um problema. Portanto, nosso cérebro está extraordinariamente condicionado, como homem de negócios, como governanta e assim por diante. E a partir desse ponto de vista estreito, olhamos para o mundo. Então, temos que entrar nessa questão, não só sobre ter problemas, mas também o que é pensar?

Por que você pensa afinal? Existe uma maneira diferente de agir? Existe uma maneira diferente de abordar a vida, a vida diária, que não exija pensar absolutamente? Oh, você não sabe de tudo isso. Portanto, primeiro temos que olhar muito de perto, juntos – não eu explico, e vocês aceitam, isso seria bobagem, mas juntos descobrir por nós mesmos e depois agir. Não dizer: “Sim, está bem”, mas agir. Nós vamos entrar nesse assunto. O que é pensar? Você não pensa? Caso contrário, você não estaria aqui. Você tomou providências para vir aqui em um determinado horário e para voltar. Isso é pensar. Pensar filosoficamente – filosofia significa amor à verdade, amor à vida, não passar em algum exame na universidade. Portanto, vamos descobrir juntos o que é pensar. Se você não tivesse memória de ontem ou do que vai acontecer amanhã – nenhuma memória de qualquer tipo, você pensaria? Você entendeu? Oh, vamos lá, senhores – vocês pensariam e agiriam desse modo se não tivessem memória? É claro que não. Por que você está hesitando? Você não pode pensar se não tiver memória. Então, o que é memória? Agora você está perplexo.

O que é memória? Você fez algo ontem e o que você fez fica registrado no cérebro, o que se torna uma memória e de acordo com a memória, você pensa e age. Certo? Então, o que é memória? Como isso se dá? Você se lembra de alguém que te lisonjeou, lembra de alguém que te machucou, que disse coisas feias sobre você ou te lisonjeou, porque você escreveu um livro. Então, você se recorda – memória. Isto é, a memória é o resultado do conhecimento. Certo? Certo? Oh, senhor! Isto é, você me insultou, isso é registrado no cérebro como uma memória. Esse insulto ou lisonja, seja ele qual for, é registrado e se torna a memória. Ou seja, o conhecimento desse incidente torna-se memória. Eu tenho um acidente de carro, esse acidente fica registrado no cérebro, nas células cerebrais. E depois ele diz: “Sim, isso é memória, eu tive um acidente, devo dirigir com cuidado”. Certo? Portanto, a partir do conhecimento vem a memória. Certo? Está claro? A partir da memória vem o pensamento.

Agora, o que é conhecimento? Isso é bastante difícil. Todos nós acumulamos conhecimento – os grandes eruditos, grandes professores, os cientistas que adquirem um tremendo conhecimento. Você entendeu? O que é conhecimento? Como é que você tem conhecimento? Você não pensou sobre tudo isso, olhou para tudo isso? O conhecimento vem quando há experiência. Certo? Você tem um acidente de carro, isso se torna… O acidente, isso é uma experiência. Certo? Certo? A partir dessa experiência você tem o conhecimento, a partir desse conhecimento você tem a memória e a partir da memória você tem o pensamento. Certo? Seja cuidadoso. Não concorde ou discorde ainda. Vou puxar o tapete sob seus pés. Então, o que é a experiência? É esse incidente. Certo? Acidente de carro, que é registrado no cérebro como conhecimento. Certo? E assim por diante. Conhecimento. Experiência – conhecimento – memória – pensamento. Está claro? Isso é lógica. Não é a minha ou sua maneira de ver. Portanto, toda experiência, seja ela a experiência de Deus ou a sua experiência é limitada. Sim? Certo? Você concorda, você vê isso? Toda experiência. Porque, você olha para ela, os cientistas estão adicionando cada vez mais a cada dia. Certo? Aquilo que se acrescenta é sempre limitado. Certo? Não concorde. Olhe para isso, olhe para isso. “Eu sei pouco e devo saber mais.” Você está adicionando. Certo? Aquilo que você adiciona é limitado. Oh, senhor! Certo?

Interrogante: Certo.

K: Portanto, a experiência é sempre limitada. Sua experiência de Deus – não sei o que isso significa, mas isso não importa – sua experiência de algo é sempre limitada, onde há algo mais a ser acrescentado. Portanto, a experiência é limitada, o conhecimento é limitado para sempre, não apenas o conhecimento futuro, ele é sempre limitado. Portanto, a memória é limitada e o pensamento é limitado. Certo? O pensamento é limitado. E onde há limitação, há divisão. Certo? Como o sikh, o hindu, o budista, o muçulmano, o cristão, o partido democrático, o partido republicano, o comunista. Você entendeu? Todos eles são baseados no pensamento. Portanto, todos os governos são limitados. Toda a sua atividade é limitada, quer você pense de forma mais abstrata ou tente ser muito nobre, isso ainda é pensamento. Certo? Portanto, a partir dessa qualidade limitada de pensamento – e o pensamento é sempre limitado, nossas ações são limitadas. Certo?

Agora, a partir disso, você começa a investigar com muito cuidado: pode o pensamento ter o seu lugar certo e não ser usado em nenhum outro lugar? Você entendeu minha pergunta? Não, não durma, por favor. Eu preciso do pensamento para vir aqui. Eu tive que me levantar em um determinado momento – todo o resto. Você também teve. Você tem que pensar lá. Então, existe uma ação que é livre de limitações? Você pensa em um minuto, eu lhe darei… Pense nisso, olhe com atenção. Isto é, o pensamento sendo limitado, nós reduzimos todo o universo a um assunto muito pequeno. Você entendeu? Nós fizemos da nossa vida um assunto muito pequeno. Eu acho que devo ser isto, não devo ser aquilo, devo ter poder, não devo… Está acompanhando? Reduzimos a enorme qualidade da vida em um assunto pequeno e mesquinho. Certo? Então, é possível ficar livre do pensamento? O que significa que eu devo pensar para vir aqui. Se eu sou um burocrata, devo pensar em termos de burocracia. Se eu vou à fábrica e giro o parafuso, devo ter certos conhecimentos. Por que eu devo ter conhecimento sobre mim? Oh, vocês. Você entendeu minha pergunta? O eu superior, o eu inferior e todas essas coisas. Por que eu devo ter conhecimento sobre isso? Isso é muito simples. Estou interessado em mim mesmo. Na verdade, só estou preocupado comigo mesmo. Podemos aparentar ter fraternidade, podemos falar de paz, podemos fazer todo tipo de explicação verbal em muitas palavras, mas sempre somos egocêntricos. Certo? Então, a partir daí surge a questão: o egocentrismo, que é essencialmente egoísmo profundo, pode haver alguma mudança? Você entendeu? Podemos ser totalmente generosos? Responda.

Então, nós temos que investigar: o que é o “eu”? Certo, senhor? O que você é, além do seu nome, profissão, dos seus votos e seguir um guru ou outro, o que é você? Diga-me. Além da sua profissão, do seu nome – ou coloque isso de outra forma: você é o seu nome? Você é a sua profissão? Ou você é parte da comunidade? Ou você é parte da tradição? Hindu – isso é uma tradição, um nome. Então, o que é você? Não repita o que o gita, upanishads ou o que alguém disse. Isso é fútil. Realmente, o que é você? Deus, qual é o problema com todos vocês? É a primeira vez que essa pergunta é feita a você? O que eu sou? Você não é o medo? Você não é o seu nome? Você não é o seu corpo? Você não é o que você pensa? A imagem que você construiu sobre si mesmo – você não é isso? Você não é a sua raiva? Ou você diz: “Não, a raiva é separada de mim”. Continue, senhor. Você não é os seus medos, suas ambições, ganância, competição, incerteza, confusão, dor, sofrimento? Vocês não são tudo isso? Você não é o guru que você segue (inaudível) e todos os tipos de coisas que você coloca ao redor do pescoço? Então, quando você se identifica com isso, ou seja, seu medo, seu prazer, dor, sofrimento, afeto, rudeza – tudo isso, você não é tudo isso? Ou você é algo de alto nível, super-eu, superconsciência? Se você diz que é a superconsciência, o eu superior, isso também faz parte do pensamento, portanto, o que você chama de pensador superior, de eu superior, ainda é muito pequeno. Então, o que eu sou? Continue, senhor, não durma.

Que horas são, senhor?

I: Dez minutos para as dez, senhor.

I: Nove e cinquenta e cinco.

K: Nós falamos quase uma hora. Já conversamos quase uma hora?

I: Sim, senhor.

K: Muito bom! Eu não sei se você acha que isso vale a pena.

Eu estou dizendo, você é um pacote de tudo isso. Certo? Tudo isso reunido pelo pensamento – eu sou hindu, eu sou Brahman, não sou Brahman, eu sou anti-Brahman e quero ser primeiro-ministro, quero ter uma posição maior, quero ter poder, posição. Certo? Não diga que não. Você quer tudo isso. Você quer estar mais perto de ser Deus, do seu guru e, portanto, o que ele diz, você segue. E você é incerto, confuso, solitário e está em sofrimento, dor, ansiedade. Certo? Você é tudo isso. O que quer que você pense, você é. Certo? Você pode inventar todos os tipos de coisas, mas essa invenção também é o que você é. Certo?

Portanto, outra questão muito, muito complicada – não vou entrar nisso agora, porque está quase na hora – quem reuniu tudo isso? Reunir tudo isso se chama “eu”, meu ego, minha personalidade, meu eu superior, meu Deus, você sabe, atman – eu invento todo esse tipo de coisa. Quem reuniu isso? Você entendeu minha pergunta? Ou existe apenas uma estrutura? Você entendeu? Você entendeu? Nós separamos tudo isso. Um dia estou bastante certo, no segundo dia estou incerto e no terceiro dia – quero dizer, terceiro dia com longos intervalos – quero, aspiro ser muito nobre, no quinto dia eu digo: “Devo ser destemido”, e assim por diante. Certo? Mudando de dia para dia. Que tipo de seres humanos nós somos! Eu sou hindu, budista e todo o resto. Quem dividiu tudo isso? Você entendeu minha pergunta? Quem disse: “Eu sou um hindu”? Ou disse: “Eu sou um muçulmano”? Isso é apenas propaganda? Divisão entre países – quem criou essa divisão? Oh, vamos lá, senhores…

I: O pensamento fez isso.

K: Sócrates? (Risos)

I: Pensamento.

K: Pensamento. Você tem certeza? Ou é o desejo, o desejo de ser identificado, de estar seguro?

I: Sim.

I: Isso também é pensamento.

K: Você poderia ouvir, senhor, antes de colocar isso? É claro que é o pensamento, mas há algo mais nisso. Pergunto-lhe com o maior respeito: quem criou essa divisão? É claro que é o pensamento, mas por trás do pensamento há algo mais. Eu sou russo, muçulmano e me agarro a isso. Certo? Para o resto da minha vida eu sou muçulmano, católico, hindu ou o que quer que seja. Quem está fazendo tudo isso, além do pensamento? Qual é o desejo, o impulso, qual é o movimento por trás disso?

I: Para se tornar.

K: Para se tornar – o que você quer dizer, para se tornar o quê?

I: Diferente do que eu sou.

I: É a segurança.

K: Finalmente. Segurança, não é? Eu quero estar seguro, é por isso que eu sigo um guru. Quero estar seguro no meu relacionamento com você, com minha esposa. “Ela é minha.” Certo? Segurança. Certo, senhor? Seguro, protegido, resguardado, algum lugar em que eu tenha isso. Certo? Em casa – isso é bastante difícil em uma fábrica ou em uma estrutura burocrática. O desejo, o impulso, a resposta, a reação é segurança – eu devo estar protegido, seguro. Certo? K, ter algum nome, título. Vocês são uma multidão louca. Ou um deputado, membro do parlamento. Está acompanhando? Os títulos são muito importantes aqui, neste país. Portanto, é uma forma de segurança. Certo? Todos vocês querem segurança, mas nós nunca questionamos se existe segurança afinal. Continue, senhor. Há algum lugar onde eu possa dizer que estou seguro? Você desconfia da sua esposa, sua esposa desconfia de você. Você desconfia do seu chefe, porque você quer o lugar dele. Isso é tudo senso comum. Vocês gostam de ser gurus (Risos) – pelo amor de Deus! Portanto, cada ser humano no mundo – você pode rir agora – cada ser humano no mundo quer ter um lugar onde ele possa estar seguro, protegido, onde não haja competição, onde ele não seja pressionado, assediado. Você não quer tudo isso? Se você for honesto para variar, você não quer tudo isso? Sim. Mas, você nunca pergunta: existe alguma segurança? Nós queremos algo, isso pode ser ilusório. Eu quero Deus, mas nós criamos Deus. Portanto, você quer segurança e deve perguntar: existe alguma segurança? Se você quiser a sua segurança, você também deve fazer a outra pergunta. Você não pode dizer que quer segurança e se agarrar a isso. Existe alguma segurança afinal?

Então, surge a pergunta: por que você quer segurança? Existe segurança em seu pensamento? Existe segurança em seu relacionamento? Não comigo, mas com sua esposa e filhos. Existe segurança em seu trabalho? Você pode ser professor, cuidadosamente protegido depois de se tornar professor, mas existem professores superiores. Você quer se tornar vice-chanceler – você conhece o jogo. Então, onde há segurança? Ou pode não haver segurança alguma. Apenas pense nisso, senhor. Veja a beleza disso. Não ter nenhum desejo por segurança. Não ter nenhum desejo, nenhum sentimento de qualquer tipo em que haja segurança – em seus votos, seus escritórios, sua fábrica, em seu parlamento e assim por diante. Existe segurança? A vida pode não ter segurança. A vida é feita para ser vivida. Não é feita para criar problemas e depois tentar resolvê-los. Não ter sofrimento, dor. É feita para ser vivida e depois morrer. Esse é um dos nossos medos, morrer. Certo? Vamos entrar em tudo isso.

Então, nesta manhã, nós aprendemos um com o outro – não ajudamos um ao outro – nós aprendemos? Nós ouvimos tudo o que o orador falou? Ouviu com o ouvido? Você viu os fatos do mundo, que é você – o mundo é você – você viu os fatos de tudo isso? Ou todos eles são ideias? Existe uma diferença entre fato e ideia. A ideia nunca é o fato. O microfone, essa coisa na frente do orador, a palavra “microfone” não é o objeto. Certo? A palavra não é a coisa, mas nós tornamos a palavra a coisa. Você entendeu o que estou dizendo? Portanto, o hindu não é você. A palavra não é você. Você é o fato, não a palavra. Eu me pergunto se você entende tudo isso. Então, podemos ver a palavra e ver que a palavra não é a coisa? A palavra “Deus” não é Deus. A palavra é totalmente diferente da realidade. Certo?

Então, estamos perguntando com todo o respeito: o que você aprendeu esta manhã? Realmente aprendeu para que você aja. Não dizer: “Sim, está bem, está bem”, e ir para casa e seguir em frente. Portanto, a menos que ajamos, o mundo estará em grande caos – não sei se você percebe isso. Existem grandes problemas no mundo, grande miséria. E o mundo é você, porque você está na miséria, está confuso, você é tudo isso, portanto, você está criando o mundo ao seu redor. Você entendeu o que estou dizendo? Pelo amor de Deus, senhor! Se você não alterar, o mundo não pode alterar, mudar. Porque o mundo aonde quer que você vá, todo ser humano no mundo está passando pelo mesmo fenômeno que você: incerto, infeliz, temeroso, inseguro, querendo segurança, tentando controlar, tentando dizer que aquele guru é melhor que o meu guru e assim por diante. Criando guerras. Você entende, senhor? O orador não é otimista ou pessimista – estamos apresentando os fatos. Não os fatos dos jornais. Estamos falando sobre os fatos da nossa vida, não sobre a vida de um guru, do imperador, de alguém ou de outra pessoa. Estamos conversando juntos sobre a sua vida. A sua vida é como a do resto do mundo. Eles estão terrivelmente infelizes, incertos, miseráveis, desempregados aos milhões, pobreza, fome, sofrimento, dor – igual a você. Você não é diferente deles. Você pode se denominar hindu, muçulmano, cristão ou o que você quiser, mas conscientemente, interiormente, você é como o resto do mundo. Você pode ser moreno, eles podem ser moreno claro, um governo diferente, mas todo ser humano compartilha esse mundo terrível. Nós fizemos o mundo. Você entendeu? Não Lenin ou Marx – nós fizemos o mundo. Nós somos a sociedade. Se você quer que a sociedade seja diferente, você tem que começar, tem que trazer ordem para a sua casa. A casa é você. Certo, senhores?

Eu terminei, senhor.

18/11/1985