11° Conversa com alunos da escola Rajghat – Banaras, Índia

Acho que devemos falar sobre algo do qual alguns de nós podem estar cientes, isto é, o desejo peculiar de poder sobre os outros e sobre si mesmo que a maioria de nós tem.

Eu acho que o poder é um dos desejos mais profundos, por trás do qual reside realmente aquele medo que vem de uma sensação de solidão, de uma sensação de frustração. O que estou dizendo pode ser difícil, mas por favor, ouça. Se alguém pode entender isto e ir além, então existe um tipo diferente de estado no qual o amor está. Se não se tem esse amor, a vida se torna monótona, cansativa, vazia e superficial.

Eu acho que é importante entender essa coisa que chamamos de poder – não o poder elétrico ou o poder à vapor, não a capacidade de fazer algo eficientemente, o que é tudo necessário. Estou falando de algo que é de maior significado, de valor muito profundo e sem entender qual eficiência, a capacidade de fazer as coisas se torna um meio de criar grande miséria, grande sofrimento para o homem.

A maioria de nós deseja poder de algum tipo, pode ser sobre o filho, a esposa ou marido, pode ser sobre um grupo de pessoas, em nome de um ideal ou em nome de um país. Este poder, este desejo de ter poder sobre os outros está sempre operando – mesmo sobre um empregado para dar-lhe ordens, ficar com raiva dele, forçá-lo. Esse desejo de poder não nasce de um sentimento de solidão? Você já se sentiu solitário? Você sabe o que é estar sozinho, não ter amigos, estar completamente sozinho, ser um ser isolado? Não ter nenhum amigo, nenhum sentimento de alguém em quem você possa contar ou em quem você possa confiar, estar em um estado de completo autoisolamento. Provavelmente, você não sentiu. A maioria de vocês evita, foge disso. Você só é despertado para isso em uma grande crise, na morte, mas você foge disso. Sem entender esse vazio, o mero controle através do poder leva a toda forma de frustração.

Provavelmente, é muito difícil entender tudo isso enquanto se é jovem, mas deve-se falar muito sobre isso, pois quando se envelhece, começa-se a ter poder sobre os outros e sobre si mesmo. O sannyasi quer ter poder sobre si mesmo e, portanto se controla através do ascetismo; isso lhe dá uma sensação de poder, uma sensação de domínio sobre si mesmo, sobre seus desejos. O fato de ele querer apenas algumas coisas para si mesmo cria nele uma extraordinária sensação de poder, um poder que é egocêntrico. E você também exige poder sobre os outros e nisso você sente uma grande sensação de libertação, de felicidade, de prazer. Você se sente capaz de dominar milhares de pessoas através de ideias, poder político, palavras. O medo está por trás de todo esse desejo de poder.

Afinal, quando você se compara com alguém, com uma ideia, uma pessoa, com um exemplo, o desejo de poder não está por trás dessa comparação? “Não tenho poder nem posição e capacidade, mas se eu puder imitar um herói, copiá-lo, eu me tornarei poderoso, serei alguém.” Portanto, o próprio desejo de ser alguém, a cópia, a imitação, a comparação, me dá uma sensação de poder.

Eu acho que é muito importante entender isso enquanto somos jovens, pois é isso que quase todo mundo está procurando no mundo. O funcionário quer ter poder sobre seu gerente, e o chefe tem inúmeros funcionários sobre os quais tem poder. Os ministros têm poder para dar posição, prestígio e tem os meios para controlar os outros. Toda a estrutura da sociedade se baseia nisso, e achamos que podemos usar o poder como meio de mudar a vida das pessoas. A própria posse do poder é um grande prazer. O homem no poder diz: “Estou fazendo isso pelo bem do meu país, estou fazendo isso pelo bem de um ideal”. Quando ele diz isso, ele está consciente de que ele está em uma posição de autoridade e que está controlando as pessoas.

Isso tem que ser entendido enquanto você está sendo educado, enquanto você está na escola ou faculdade. Você tem que ver se pode viver neste mundo sem dominar as pessoas, sem controlá-las, sem moldar suas mentes. Afinal, cada um de nós é tão importante quanto o político, o detentor do poder. Cada um de nós quer crescer em liberdade para que possamos ser o que somos, para que possamos compreender o que somos e, a partir disso, agir. Para que não haja imposição da sociedade, dos nossos professores, dos nossos pais ou de qualquer outra pessoa que esteja tentando dominar e moldar nossas vidas particulares. É muito difícil se opor a tudo isso, pois cada um de nós quer poder. O professor quer se tornar o diretor, pois o diretor tem poder sobre muitas pessoas e tem mais dinheiro.

Quando você é controlado por outro através do dinheiro, posição, através do status, o sentimento de que você é um indivíduo, um ser humano, uma única unidade, é completamente negado, destruído. Enquanto que, a meu ver, é muito importante em uma escola deste tipo que criemos o sentimento de que esta é a nossa escola, sua e minha, no sentido de que você como aluno é tão importante quanto o professor ou o diretor. Esse sentimento de “nosso” não existe em nenhum lugar do mundo – o sentimento de que esta é a nossa Terra, sua e minha, não dos russos, americanos, dos ingleses ou africanos. O sentimento de que é o nosso mundo, não um mundo comunista, socialista ou capitalista; o sentimento de que é a nossa Terra na qual você, eu e outros podemos viver e ser livres para descobrir todo o significado de viver.

O significado e a compreensão de viver são negados se estivermos buscando poder sob qualquer forma. A mãe tem poder sobre o filho pequeno e quer que ele cresça de uma certa maneira. O pai diz: “Isso é o que ele deve ser”, e o empurra para um padrão. Mas, a educação é certamente a libertação da mente para que ela funcione em liberdade sem qualquer distorção, sem qualquer corrupção pelo poder, pela comparação. Devemos criar tal escola, você e eu devemos criá-la. Caso contrário, você sairá desta escola e faculdade como qualquer outro ser humano, estúpido com seu cérebro cheio de informações superficiais. Você não terá nenhuma iniciativa própria clara, mas será uma máquina movida pelas circunstâncias, pela sociedade, pelo político, porque cada um de vocês quer poder como o político.

Portanto, mesmo que você não entenda por enquanto o que estou dizendo, converse com seus professores, faça-os explicar tudo isso para você, que esta é a nossa Terra onde todos os seres humanos podem viver, compreender, exercer suas capacidades sem destruir ninguém. No momento em que queremos usar nossa capacidade para ganhar poder, posição, prestígio, nós destruímos. Então, devemos falar sobre como criar uma escola aqui, onde cada um de nós, o aluno, o professor, os membros da fundação, todos criam este lugar juntos – com você como aluno cuidando das árvores e das estradas, sentindo e cuidando das coisas que são da Terra, não porque é a sua escola, mas porque é a nossa Terra.

Acho que esse é o único espírito que vai salvar o mundo, não invenções científicas inteligentes, mas a sensação de que você e eu estamos criando juntos em um mundo que é nosso. Mas isso é muito difícil de acontecer, porque agora tudo é “meu” e não “nosso”, o “meu” está sendo dividido em muitas classes, muitas propriedades, muitas funções, muitas nacionalidades. Esse sentimento de “nosso” não existe neste mundo, mas sem esse sentimento não teremos paz no mundo. Portanto, é muito importante que você, enquanto jovem, compreenda isso e tenha esse sentimento para que, ao sair deste lugar, você possa criar um novo mundo e uma nova geração.

Interrogante: Por que nos sentimos tristes quando morre alguém que conhecemos, que amamos?

Krishnamurti: Você se sente triste quando algum amigo ou parente próximo morre. Você se sente triste pela pessoa que está morta ou por você mesmo? A outra pessoa se foi, e você é deixado para enfrentar a vida. Com essa pessoa você se sentiu um pouco seguro, um pouco feliz, sentiu um companheirismo, uma amizade. Essa pessoa se foi, e você fica inseguro, não é? Você está constantemente ciente da sua solidão. Você está ciente de que foi despojado de companheirismo. Havia uma pessoa com quem você podia conversar e expressar como você era. Quando essa pessoa se vai, você se sente muito triste. Por sua solidão, por não ter ninguém a quem recorrer, você se sente muito triste, mas não se sente triste por essa pessoa, você se sente triste por si mesmo. E sentindo-se triste, você cria todos os tipos de teorias, todos os tipos de crenças.

É muito importante entender esse processo de dependência. Por que alguém deve depender de outro? Para certas coisas, eu dependo do leiteiro, do carteiro, do homem que dirige a locomotiva, do banco ou do policial, mas minha dependência em relação a eles é totalmente diferente da dependência baseada no medo e na demanda interna por conforto. Como não sei como viver, estou confuso, estou sozinho, quero que alguém me ajude, quero alguém que me guie, alguém em quem eu possa confiar, um mestre, um livro ou uma ideia. Quando essa dependência é tirada de mim, sinto-me perdido e essa sensação de perda gera sofrimento.

Não é importante, enquanto estamos na escola, compreender esse problema da dependência para que possamos crescer sem depender de ninguém interiormente? Isso requer muita inteligência, muita investigação. Certamente, é função da educação ajudar a libertar a mente de qualquer sentimento de medo que gere dependência. Sendo dependentes, dizemos: “Como posso me libertar da dependência?” Mas se alguém entendesse o processo, as formas de dependência, então não haveria problema de como se livrar disso. O próprio entendimento liberta a mente da dependência.

Interrogante: O que é uma estrela?

Krishnamurti: Lamento não poder lhe dar uma explicação científica. Você pode descobrir o que é uma estrela em qualquer livro científico ou com o seu professor de ciências.

Você já olhou para uma estrela? O que você sente quando olha para uma estrela? Quando você olha para o céu à noite e vê os muitos milhares, milhões de estrelas e planetas, o que você sente? Você apenas olha e se afasta? A maioria de nós faz isso. Estamos conversando com alguém e dizemos: “Olhe para as estrelas e a Lua, que noite linda”, e a partir disso continuamos com nossa conversa. Mas, se você está sozinho ou com pessoas que nem sempre estão tagarelando ou conversando, mas que querem ver as coisas, então quando você olha para as estrelas, o que você sente? Você se sente pequeno neste vasto universo ou você sente que ele é parte de você, a coisa toda – as estrelas, a Lua, as árvores e o rio? Você tem tempo para olhar e descobrir o seu próprio sentimento?

Como é difícil olhar para algo belo sem que a mente interfira, sem que a mente com suas memórias diga: “Esta não é uma noite tão boa quanto a outra noite. Não é tão bonito quanto no ano passado. Está muito frio, eu não consigo olhar.” A mente nunca olha sem palavras, sem comparação. É somente quando você olha sem comparação ou sem palavras que as estrelas, a Terra, as árvores, a Lua e a luz na água têm um significado extraordinário. Nisso existe uma grande beleza. Para olhar sem comparação é preciso entender a mente, pois é a mente que olha, é a mente que interpreta o que vê dando-lhe um nome. A própria nomeação de uma coisa pela mente torna-se uma maneira de afastá-la.

Então, quando você olhar para uma estrela, um pássaro ou uma árvore, descubra o que está acontecendo com você enquanto você olha, e isso revelará muito sobre você.

Interrogante: O homem fez grande progresso no mundo material. Por que não vemos progresso em outras direções?

Krishnamurti: Está bastante claro porque progredimos no mundo material, especialmente no novo mundo onde há uma grande quantidade de energia, uma grande liberação de capacidade intelectual. Quando você está colonizando um novo mundo, você tem que inventar, tem que lutar. O homem progrediu do arco e flecha para a bomba atômica, do carro de boi para o avião a jato que percorre cerca de 1600 milhas por hora. Isso geralmente é chamado de progresso. Mas, há progresso em alguma outra direção, interiormente? Você, como indivíduo, progrediu interiormente? Você encontrou alguma coisa para si mesmo?

Sabemos o que outras pessoas disseram, o que outras pessoas descobriram. Mas, encontramos alguma coisa para nós mesmos? Somos mais caridosos, mais gentis? Nossas mentes estão mais expansivas e alertas interiormente? Afastamos o medo? Sem essas coisas, progredir no mundo é destruir a nós mesmos.

Interrogante: O que é Deus?

Krishnamurti: Você sabe que para o aldeão, para o camponês, Deus é aquela pequena imagem diante da qual ele coloca algumas flores. As pessoas primitivas chamam o trovão de Deus, e outros veneram as árvores e a natureza. Em algum momento, o homem venerava a macieira e a oliveira na Europa. Há pessoas na Índia atualmente que veneram as árvores.

Entre em qualquer templo e lá você verá uma imagem coberta de óleo, grinaldas e joias, você chama isso de seu Deus, coloca flores e faz puja diante disso. Você pode ir mais longe e criar uma imagem em sua mente, uma ideia que nasce da sua própria tradição, da sua própria formação e você chama isso de seu Deus. O homem que jogou a bomba atômica pensou que Deus estava ao seu lado. Todo senhor da guerra, desde Hitler e Kitchner até qualquer pequeno general, invoca Deus. Essa imagem ou essa ideia é realmente Deus? Ou Deus é algo inimaginável, não mensurável por nossas mentes?

Deus é algo totalmente insondável para nós e só surge quando nossas mentes estão quietas, quando nossas mentes não estão projetando, lutando. Quando a mente estiver quieta, então talvez saibamos o que é Deus.

Então, é muito importante, enquanto somos jovens, não sermos pegos pela palavra “Deus”, não aceitar o que nos dizem que Deus é. Há muitas pessoas ansiosas para nos dizer o que Deus é. Mas, devemos examinar o que elas dizem. E há muitas pessoas que também dizem que Deus não existe. Nós não devemos também ser pegos pelo que elas dizem, mas devemos examinar com igual cuidado. O que acredita e o que não acredita jamais encontrarão Deus. É somente quando a mente está livre da crença e da descrença, é somente quando a mente está quieta que existe a possibilidade de encontrar Deus.

Nós nunca somos informados sobre essas coisas. Desde a infância lhe dizem que Deus existe, e você repete isso. Quando você for a algum guru, ele lhe dirá: “Deus existe, faça isto e aquilo, repita este mantra, faça aquele puja, pratique tal e tal disciplina e você encontrará Deus”. Você pode fazer tudo isso, mas o que você encontrar não será Deus, será apenas a sua própria projeção, a projeção do que você quer.

Tudo isso é difícil e requer muita reflexão e investigação. É por isso que quando você está em uma escola deste tipo, você deve crescer em liberdade para que sua mente possa encontrar por si mesma, possa descobrir, então a mente se torna criativa, surpreendentemente alerta.

Interrogante: Por que um ser humano sofre, embora faça o melhor que pode com qualquer capacidade que tenha?

Krishnamurti: Qualquer que seja a capacidade que eu possua, no próprio ato de fazer, por que me sinto triste quando não consigo realizar, quando não consigo cumprir minha intenção? Quando você está fazendo algo com o melhor de sua capacidade, por que você se sente triste? Não é simples essa pergunta?

Não estamos satisfeitos em apenas fazer o que gostamos de fazer, queremos que o que fazemos seja um sucesso. Para nós, o fazer não é importante, mas sim o que o sucesso, o resultado, o que o fazer trará. Quando a nossa ação não é bem-sucedida, quando não produz o que queremos nos sentimos tristes. A motivação por trás da nossa ação é o nosso desejo por sucesso, poder, nosso desejo por reconhecimento, posição, status. Queremos que alguém nos diga o quão maravilhosamente temos feito. Tudo isso significa que realmente nunca sabemos amar uma coisa e fazê-la apenas por si mesma, não pelo que ela trará. Fazemos tudo com um olho no sucesso, no futuro, no amanhã e quando o amanhã não chega nos sentimos miseráveis; isso porque nunca fazemos nada por amor à coisa em si.

Há muitos aqui que são professores e outros que são grandes empresários ou funcionários. Por que você está nessas profissões? Não porque você ama o que faz, mas porque não há mais nada para você fazer. Portanto, o que quer que você faça, você quer que seja bem-sucedido. Você quer surfar na onda do sucesso e, por isso está sempre competindo, lutando, destruindo as capacidades da mente.

Interrogante: Como podemos viver uma vida sem experiência e memória?

Krishnamurti: Você se lembra do que eu disse outro dia? Você quer saber como se livrar da memória. Ou seja, você quer encontrar um método, um sistema. Mas o sistema, o método só lhe dá mais experiência, ele só cultiva a memória, não é? Quando eu sei como fazer uma coisa, isso se torna um hábito. Se eu sei ler e escrever, o “como” passa a fazer parte da minha memória e com essa memória eu escrevo e reconheço cada palavra, cada sílaba.

Quando eu disse outro dia era sobre algo totalmente diferente. Eu disse que a vida é um processo de experiência e memória. O próprio viver é experiência, e a experiência cria tradição, memória. E com essa tradição, memória e hábito nós vivemos. Portanto, nunca há nada de novo. Não é possível viver com uma experiência que não corrompa, que não se torne apenas uma memória através da qual se olha para a vida? Discutimos isso com muito cuidado, mas é preciso entrar detalhadamente em muitos pontos de vista diferentes para entender todo o significado disso.

Interrogante: A história prova a existência de Deus?

Krishnamurti: É uma questão de prova? A história pode ou não provar que Deus existe ou não. Milhões dizem que Deus existe, e milhões dizem igualmente de forma enfática que Deus não existe. Cada lado cita autoridades, história, prova científica.

A mente é assustada, ela quer algo em que possa confiar, algo em que possa depender. A mente quer algo permanente ao qual possa se agarrar. Com esse desejo de permanência, ela procura autoridade de forma negativa ou positiva. Quando procura autoridade naqueles que dizem que não há Deus, ela repete e diz: “Não há Deus”. A mente está perfeitamente satisfeita com essa crença. E há aqueles que, buscando permanência, dizem que Deus existe. Portanto, a mente se agarra a isso e procura provar através da história, dos livros, através das experiências de outras pessoas que Deus existe, mas isso não é a realidade, isso não é Deus.

A mente deve estar livre, desde o início, para descobrir o que é Deus. E a mente não é livre quando procura segurança, quando procura permanência, quando está presa pelo medo.

18/01/1954