Primeira discussão na Câmara Municipal,

    Auckland, Nova Zelândia.

Amigos, acho que cada um de nós está envolvido em um problema religioso, em uma luta social ou conflito econômico. Cada um de nós está sofrendo pela falta de compreensão desses vários problemas, e tentamos resolver cada um desses problemas por si só; isto é, se vocês têm um problema religioso, vocês pensam que vão resolvê-lo afastando o problema econômico ou social e centrando-se inteiramente no problema religioso. Ou vocês têm um problema econômico e pensam que vão resolvê-lo limitando-se completamente a esse conflito específico. Enquanto eu digo que vocês não podem resolver esses problemas por si mesmos; vocês não podem resolver o problema religioso por si só, nem o problema econômico e o social, a menos que vocês vejam a inter-relação entre os problemas religiosos, sociais e econômicos.

O que chamamos de problemas são apenas sintomas, que aumentam e se multiplicam porque não abordamos a vida como um todo, mas a dividimos em problemas econômicos, sociais ou religiosos. Se vocês olharem para todas as várias soluções que são oferecidas para as várias perniciosidades, vocês verão que elas lidam com os problemas separadamente, em compartimentos isolados e não abordam os problemas religiosos, sociais e econômicos de forma abrangente, como um todo. Agora, é minha intenção mostrar que enquanto lidarmos com esses problemas separadamente, de forma isolada, nós apenas aumentaremos a incompreensão e, portanto, o conflito e, desse modo, o sofrimento e a dor; ao passo que, enquanto não lidarmos com os problemas sociais, religiosos e econômicos como um todo, de forma abrangente, não separadamente, vendo a conexão delicada e sutil entre o que chamamos de problemas religiosos, sociais e econômicos – até que vocês vejam essa conexão real, essa conexão íntima e sutil entre esses três, seja qual for o problema que vocês possam ter, vocês não vão resolvê-los. Vocês apenas aumentarão a luta. Embora possamos pensar que resolvemos um problema, esse problema surge novamente de uma forma diferente, então passamos a vida resolvendo problema após problema, luta após luta, sem compreender completamente o significado de nossa vida.

Assim, para compreendermos a íntima conexão entre o que chamamos de problemas religiosos, sociais e econômicos, deve haver uma reorientação completa do pensamento – ou seja, cada indivíduo não deve mais ser uma engrenagem, uma máquina, seja na estrutura social ou religiosa. Olhem e vocês verão que a maioria dos seres humanos são escravos, apenas engrenagens nessa máquina. Eles não são verdadeiramente seres humanos, mas apenas reações a um ambiente definido e, portanto, não há verdadeira ação individual, pensamento individual; e para descobrirem essa íntima relação entre todas as nossas ações, sejam elas religiosas, políticas ou sociais, vocês devem pensar como indivíduos, não como um grupo, não como um corpo coletivo; e essa é uma das coisas mais difíceis de fazer, para os indivíduos saírem da estrutura social ou religiosa e examiná-la criticamente, para descobrirem o que é falso e o que é verdadeiro nessa estrutura. E então verão que vocês não estão mais preocupados com um sintoma, mas estão tentando descobrir a causa do problema em si, e não apenas lidando com os sintomas.

Talvez alguns de vocês digam no final de minha palestra que não lhes dei nada de positivo, nada em que possam trabalhar definitivamente, um sistema que possam seguir. Eu não tenho nenhum sistema. Eu penso que os sistemas são coisas perniciosas, porque eles podem aliviar os problemas momentaneamente, mas se vocês apenas seguirem um sistema, vocês são um escravo dele. Vocês apenas substituem um sistema antigo por um novo, o que não traz compreensão. O que traz compreensão não é buscar um sistema novo, mas descobrir por si mesmo como indivíduo – não como uma máquina coletiva, mas como indivíduo – o que é falso e o que é verdadeiro no sistema existente, não substituir um sistema antigo por um novo.

Agora, ser capaz de criticar, ser capaz de questionar, é o primeiro requisito essencial para qualquer homem pensante, para que ele comece a descobrir o que é falso e o que é verdadeiro no sistema existente e, portanto, a partir desse pensamento existe ação e não mera aceitação. Portanto, durante esta conversa, se vocês quiserem compreender o que vou dizer, deve haver crítica. A crítica é essencial. O questionamento é necessário, mas fomos treinados para não questionar, para não sermos críticos, temos sido treinados cuidadosamente para nos opor. Por exemplo, se eu disser algo que vocês não gostem – como eu devo, assim espero – vocês naturalmente começarão a se opor, porque a oposição é mais fácil do que descobrir se o que estou dizendo tem algum valor. Se vocês descobrirem que o que estou dizendo tem valor, então há ação e, portanto, vocês terão que alterar toda a atitude de vocês em relação a vida. Portanto, como não estamos preparados para fazer isso, elaboramos uma técnica esperta de oposição. Ou seja, se eu disser alguma coisa que vocês não gostem, vocês trarão à tona todos os seus preconceitos profundamente enraizados e bloquearão, e se eu disser qualquer coisa que possa feri-los ou que possa perturbá-los emocionalmente, vocês se abrigarão atrás desses preconceitos, dessas tradições, desse conhecimento; e a partir desse conhecimento vocês reagirão, e essa reação vocês chamam de crítica. Para mim não é crítica. É apenas uma oposição esperta, o que não tem valor.

Agora, se todos vocês são cristãos – e presumivelmente todos vocês são cristãos – talvez eu diga algo que vocês podem não compreender e, em vez de tentarem descobrir o que quero transmitir, vocês imediatamente se refugiarão atrás das tradições, atrás dos preconceitos enraizados e autoridades da ordem estabelecida; e a partir dessa fortaleza, na defesa, no ataque. Para mim, isso não é crítica; essa é uma maneira esperta de não agir, de evitar a ação plena, completa.

Se vocês quiserem compreender o que vou dizer, peço que sejam realmente críticos, não espertos em sua oposição. Ser crítico exige grande inteligência.

A crítica não é ceticismo ou aceitação; isso seria igualmente estúpido. Se vocês apenas disserem: Bem, eu sou cético sobre o que você diz”, isso seria tão estúpido quanto simplesmente aceitar. Ao passo que a verdadeira crítica não consiste em dar valores, mas em tentar descobrir os verdadeiros valores. Não é assim? Se vocês dão valores às coisas, se a mente dá valores, então vocês não estão descobrindo o mérito intrínseco da coisa – e a maioria de nossas mentes é treinada para dar valores. Vejam o dinheiro, por exemplo. Abstratamente, o dinheiro não tem valor, ele tem o valor que damos a ele. Ou seja, se vocês querem o poder que o dinheiro dá, então vocês usam o dinheiro para obterem esse poder, assim vocês estão dando valor a algo que não tem valor inerentemente; da mesma forma, se vocês vão descobrir e compreender o que vou dizer, vocês devem ter essa capacidade de crítica, o que é realmente fácil se vocês quiserem investigar, se vocês quiserem encontrar, não se vocês disserem: ”Bem, eu não quero ser atacado. Estou na defensiva. Tenho tudo o que quero, estou perfeitamente satisfeito.” Então tal atitude é bastante desesperadora. Então vocês estão aqui apenas por curiosidade – e a maioria de vocês provavelmente está – e o que eu direi não terá significado e, portanto, vocês dirão que é negativo, nada construtivo, nada positivo.

Então, por favor, tenham isto em mente: vamos descobrir esta noite, vamos considerar juntos quais são as coisas falsas e verdadeiras nas condições sociais e religiosas existentes. E para fazerem isso, por favor, não tragam continuamente seus preconceitos, sejam eles cristãos ou de alguma outra seita, mas tenham essa atitude inteligente, crítica, não apenas em relação ao que vou dizer, mas em relação a tudo na vida, o que significa o fim da busca por novos sistemas, não a busca por um novo sistema que, quando encontrado, será novamente deturpado, corrompido. Na descoberta do falso e do verdadeiro nos sistemas social, religioso e econômico – o falso e o verdadeiro que criamos para nós mesmos – na descoberta disso, evitaremos que nossas mentes e corações criem ambientes falsos nos quais a mente provavelmente poderá ser capturada novamente.

A maioria de vocês está buscando um novo sistema de pensamento, um novo sistema econômico, um novo sistema de filosofia religiosa. Por que vocês estão procurando um novo sistema? Vocês dizem: “Estou insatisfeito com o velho”, isto é, se vocês estão procurando. Agora eu digo, não busquem um novo sistema, mas examinem o próprio sistema no qual vocês estão presos, e então vocês verão que nenhum sistema de qualquer tipo trará a inteligência criativa, que é essencial para a compreensão da verdade, de Deus ou qualquer nome que vocês queiram dar a isso. Isso significa que não seguindo sistema algum, vocês descobrirão essa realidade eterna; mas vocês só vão encontrá-la quando vocês, como indivíduos, começarem a compreender o próprio sistema que vocês construíram ao longo dos séculos e, nesse sistema, descobrir o que é verdadeiro e o que é falso.

Então, por favor, tenham isto em mente: eu não estou oferecendo um novo sistema de filosofia. Eu penso que esses sistemas são gaiolas para capturar a mente. Eles não ajudam o homem, eles são apenas obstáculos. Esses sistemas são um meio de exploração. Ao passo que se vocês, como indivíduos, começarem a questionar, verão que nesse questionamento vocês criarão um conflito, e a partir desse conflito vocês compreenderão – e não na mera aceitação de um novo sistema que apenas os faz dormir e transforma vocês em outra máquina.

Então, vamos descobrir o falso e o verdadeiro nos sistemas existentes – os sistemas da religião e da sociologia. Para descobrir o que é falso e verdadeiro, devemos ver em que se baseiam as religiões. Agora, estou falando de religião como a forma cristalizada de pensamento que se tornou o ideal mais elevado da comunidade. Espero que vocês estejam acompanhando tudo isso. Ou seja, as religiões como elas são, não como vocês gostariam que fossem. Como elas são, em que se baseiam? Qual é o fundamento delas? Quando você vê, quando você examina e realmente pensa criticamente sobre o assunto – não trazendo suas esperanças e preconceitos, mas quando você realmente pensa sobre o assunto – você vê que elas são baseadas em conforto, em lhe dar conforto quando você está sofrendo. Ou seja, a mente humana está continuamente buscando segurança, uma posição de certeza, seja em uma crença, um ideal ou conceito. Assim vocês estão continuamente buscando uma certeza, segurança, na qual a mente se refugia na forma de conforto. Agora, o que acontece quando vocês estão continuamente buscando segurança, proteção, certeza? Isso cria medo naturalmente, e quando há medo existe conformidade. Por favor, não tenho tempo para entrar em detalhes. Farei isso em minhas várias palestras, mas nesta palestra quero colocar tudo de forma concisa e, se estiverem interessados, vocês podem pensar sobre isso, e então podemos discutir isso em reuniões de perguntas e respostas.

Assim, as chamadas religiões dão o padrão de conformidade à mente que busca segurança nascida do medo, à mente que busca conforto; e onde há busca por conforto não há compreensão. Nossas religiões em todo o mundo, em seu desejo de dar-lhes conforto, em seu desejo de conduzi-los a um determinado padrão, moldá-los, lhes dão vários padrões, moldes, seguranças através do que eles chamam de fé. Esta é uma das coisas que elas exigem: fé. Por favor, não entendam mal. Não pulem na minha frente. Elas exigem fé, e vocês aceitam a fé porque ela lhes dá abrigo do conflito da existência diária, da luta contínua, das preocupações, dores e tristezas. Então, a partir dessa fé, que deve ser uma fé dogmática, as igrejas nascem. E a partir das igrejas, são estabelecidas as ideias, as crenças.

Agora, para mim – e por favor, tenham isto em mente, quero que vocês sejam críticos, não aceitem – para mim todas as crenças, todos os ideais são um obstáculo, porque nos impedem de compreender o presente. Vocês dizem que as crenças, os ideais, a fé, são necessários como um farol que guia através da confusão da vida. Isto é, vocês estão mais interessados em crenças, tradições, ideais e fé do que em compreender a própria confusão. Para compreender a confusão, vocês não podem ter uma crença, um preconceito; vocês devem olhá-la completamente, considerá-la com uma mente fresca, com uma mente não corrompida – não com uma mente influenciada por um preconceito específico, que chamamos de ideal. Portanto, onde há uma busca por conforto, por segurança, deve haver um padrão, um molde no qual nos abrigamos e, portanto, começamos a preconceber o que Deus deve ser ou o que a verdade deve ser.

Agora, para mim, existe uma realidade viva. Existe algo que está eternamente se tornando, fundamental, real, duradouro, mas que não pode ser preconcebido; isso exige que não haja crença, exige uma mente que não esteja presa a um ideal, como um animal amarrado em um poste, mas ao contrário, exige uma mente que esteja continuamente em movimento, experimentando, nunca estática. Eu digo que há uma realidade viva; chamem ela de Deus, de verdade, de qualquer coisa que vocês queiram – o que é de muita pouca importância – e para compreendê-la é preciso haver inteligência suprema e, portanto, não pode haver nenhuma conformidade, mas sim o questionamento daquelas coisas falsas e verdadeiras em que a mente está presa. E vocês verão que a maioria das pessoas, a maioria de vocês com inclinação religiosa, está em busca da verdade, e essa mesma busca indica que vocês estão fugindo do conflito atual ou estão insatisfeitos com a condição presente. Portanto, vocês tentam descobrir o que é o real; isto é, vocês abandonam a condição que gera conflito, fogem, tentando descobrir o que é Deus, o que é a verdade. Portanto, essa busca é a negação da verdade, porque vocês estão fugindo – há fuga, desejo por conforto, desejo por segurança. Portanto, quando as religiões são baseadas da forma como são, em dar-lhes segurança, deve haver exploração; e, para mim, as religiões como elas existem nada mais são do que uma série de explorações. O que chamamos de mediadores entre nosso conflito atual e aquela suposta realidade tornaram-se nossos exploradores, e eles são os sacerdotes, os mestres, os professores, os salvadores; porque digo que só compreendendo o conflito atual, com todo o seu significado, com todas as suas nuances delicadas, somente assim que vocês podem descobrir o que é o real, e ninguém pode guiá-los a isso.

Se tanto o investigador quanto o professor soubessem o que é a verdade, então ambos poderiam ir em direção a ela; mas o discípulo não pode saber o que é a verdade. Portanto, sua investigação pela verdade só pode existir no conflito e não fora dele e, desse modo, para mim, qualquer professor que descreva o que é a verdade, o que é Deus, está negando essa própria coisa, essa coisa imensurável que não pode ser medida por palavras. A ilusão das palavras não pode segurá-la, e a ponte das palavras não pode levá-los a ela. É somente quando vocês, como indivíduos, começarem a perceber no imenso conflito a causa e, portanto, a falsidade desse conflito, que vocês descobrirão o que é a verdade. Nisso existe felicidade eterna, inteligência; mas não nesta coisa espúria chamada espiritualidade, que é apenas uma conformidade, conduzida por autoridades através do medo. Eu digo que existe algo perfeitamente real, infinito; mas para descobri-lo, o homem não deve ser uma máquina imitativa, e nossas religiões nada mais são do que isso. Além disso, nossas religiões ao redor do mundo mantêm as pessoas separadas. Ou seja, vocês, com seus preconceitos particulares, chamando-se cristãos e os indianos, com suas crenças particulares, chamando-se hindus, nunca se encontram. Suas crenças estão mantendo vocês separados. Suas religiões estão mantendo vocês separados. Vocês dizem: “Mas se os hindus pudessem se tornar cristãos, então teríamos uma unidade”. Ou os hindus dizem: “Deixem que todos eles se tornem hindus”. Mesmo assim há uma divisão, porque a crença exige uma divisão, uma diferença e, portanto, exploração e luta contínua de classes distintas.

Dizemos que as religiões unificam. Pelo contrário, olhem para o mundo dividido em pequenas seitas estreitas, lutando umas contra as outras para aumentar seus membros, suas riquezas, suas posições, suas autoridades, pensando que são a verdade. Existe apenas uma verdade, mas vocês não podem chegar a ela por meio de nenhuma seita, por meio de nenhuma religião. Para descobrir o que é verdadeiro e falso na religião, vocês não podem ser uma máquina; vocês não podem aceitar as coisas como elas são. Vocês aceitarão se estiverem satisfeitos e, se estiverem satisfeitos, vocês não me ouvirão e nossa conversa será inútil. Mas se vocês estiverem insatisfeitos, eu os ajudarei a questionar corretamente e, a partir desse questionamento, vocês descobrirão o que é a verdade e, nessa descoberta do que é verdadeiro, vocês descobrirão como viver ricamente, completamente, em êxtase; não com esta luta constante, lutando contra tudo pela sua própria segurança, o que vocês chamam de mérito.

Novamente, esse medo que é criado pela busca por segurança, esse medo busca abrigo na sociedade. A sociedade nada mais é do que a expressão do indivíduo multiplicado por mil. Afinal, a sociedade não é uma coisa misteriosa. Ela é o que vocês são. É esmagadora, controladora, dominadora. A sociedade é a expressão do indivíduo. Esta sociedade oferece segurança através da tradição, o que chamamos de opinião pública. Isto é, a opinião pública diz que possuir, ter riquezas, é perfeitamente ético, moral e lhes dá distinção neste mundo, lhes confere honras; vocês são grandes pessoas neste mundo. Isso é o que é aceito tradicionalmente. Essa é a opinião que vocês criaram como indivíduos, porque vocês estão buscando isso. Todos vocês querem ser alguém no estado, seja senhores ou lordes, vocês sabem, tudo isso, que se baseia em possessividade, posses; e isso se tornou moral, verdadeiro, bom, perfeitamente cristão ou perfeitamente hindu. É a mesma coisa. Agora, chamamos isso de moralidade. Chamamos de moralidade ajustar-se a um padrão. Por favor, eu não estou pregando o contrário disso. Estou lhes mostrando a falsidade disso e, se vocês quiserem descobrir, agirão, não buscarão o oposto. Ou seja, vocês consideram as posses, seja sua esposa, seus filhos, suas riquezas, vocês consideram isso perfeitamente moral. Agora, suponham que outra sociedade surja, onde as posses são um mal, onde essa ideia de possessividade é eticamente proibida – impulsionada pelas circunstâncias, pelas condições, pela educação, pela opinião, a possessividade é conduzida à sua mentalidade. Então a moralidade perde todo o significado, a moralidade é, portanto, apenas uma conveniência. Não a percepção correta das coisas, mas o ajuste esperto às circunstâncias – isso vocês chamam de moralidade. Suponham que vocês queiram, como indivíduos, não serem possessivos, vejam o que vocês têm que enfrentar! Todo o sistema da sociedade nada mais é do que possessividade. Se vocês quiserem compreender isso e não serem guiados pelas circunstâncias, que não são chamadas de morais, então vocês, como indivíduos, devem começar a romper com esse sistema voluntariamente e não serem conduzidos como ovelhas a aceitarem a moralidade da não-possessividade.

Agora vocês são conduzidos quer gostem ou não, quer pensem que isso é são ou não; vocês são movidos pelas condições, pelo ambiente que vocês criaram, porque vocês ainda são possessivos, e agora talvez outro sistema surja e os conduza ao aposto – a serem não-possessivos. Certamente, isso não é moralidade; é apenas serem conduzidos pelo ambiente para serem possessivos ou não-possessivos. Considerando que, para mim, a verdadeira moralidade consiste em compreender totalmente o absurdo da possessividade e combatê-la voluntariamente; não sendo conduzido de qualquer maneira.

Agora, se vocês observarem, esta sociedade é baseada em consciência de classes, que é novamente a consciência de segurança. Assim como as crenças se desenvolvem em religiões, da mesma forma as posses se desenvolvem na expressão da nacionalidade. Assim como as crenças separam as pessoas, condicionam as pessoas, as mantêm isoladas, da mesma maneira a possessividade, expressando-se como consciência de classe e desenvolvendo-se em nacionalidade, mantém as pessoas isoladas. Isto é, toda nacionalidade se baseia na exploração da maioria pela minoria para seu próprio benefício, através dos meios de produção. Essa nacionalidade, através do instrumento do patriotismo, é um meio de guerra. Todas as nacionalidades, todos os governos soberanos devem se preparar para a guerra; é dever deles, e não é verdadeiro vocês serem pacifistas e ao mesmo tempo falarem de patriotismo. Vocês não podem falar sobre fraternidade e depois falarem sobre cristianismo, porque uma coisa nega a outra; seja aqui, na índia ou em qualquer outro país. Na Índia, eles podem falar sobre o hinduísmo e dizer que somos um, que toda a humanidade é uma. Isso são apenas palavras – hipocrisia.

Portanto, todas as nacionalidades são um meio de guerra. Quando eu estava falando na Índia, eles me disseram (no momento, os hindus estão passando por essa doença do nacionalismo): “Vamos cuidar primeiro do nosso próprio país, porque há tantas pessoas famintas; depois podemos falar sobre a unidade humana”, o que é a mesma coisa que vocês falam aqui. “Vamos nos proteger e depois falaremos sobre unidade, fraternidade e todo o resto.” Agora, se a Índia está realmente preocupada com o problema da fome ou se vocês estão realmente preocupados com o problema do desemprego, vocês não podem lidar apenas com o problema do desemprego na Nova Zelândia; é um problema humano, não o problema de um grupo específico chamado Nova Zelândia. Vocês não podem resolver o problema da fome como um problema indiano, chinês ou o problema do desemprego como um problema inglês, alemão, americano ou australiano, mas devem tratá-lo como um todo; e vocês só podem lidar com ele como um todo quando vocês não são nacionalistas, quando vocês não são explorados por meio do patriotismo. Vocês não são patriotas todas as manhãs quando acordam. Vocês só são patriotas quando os jornais dizem que vocês devem ser, porque vocês devem conquistar seu vizinho. Nós somos, portanto, os bárbaros, não aquele que está invadindo seu país. O bárbaro é o patriota. Para ele, seu país é mais importante do que a humanidade, do que o homem; e digo que vocês não resolverão seus problemas, esse problema econômico e de nacionalidade, enquanto vocês forem neozelandeses. Vocês só o resolverão quando forem verdadeiros seres humanos, quando estiverem livres de todos os preconceitos nacionalistas, quando não forem mais possessivos e quando sua mente não estiver dividida por crenças. Então aí pode haver unidade humana real, e então o problema da fome, o problema do desemprego, o problema da guerra, desaparecerão, porque vocês consideram a humanidade como um todo e não algumas pessoas em particular que querem explorar outras pessoas.

Então vocês veem o que está dividindo os homens, o que está destruindo a verdadeira glória de viver, a partir da qual somente vocês podem encontrar aquela realidade viva, aquela imortalidade, aquele êxtase; mas para encontrá-la, vocês devem antes de tudo ser indivíduos. Isso significa que vocês devem começar a compreender e, portanto, agir para descobrir o que é falso no sistema existente e, assim, vocês formarão um centro como indivíduos. Vocês não podem alterar a massa. O que é a massa? Vocês multiplicados. Estamos esperando pela massa para agir, esperando que por algum milagre haja uma mudança completa da noite para o dia, porque não pensamos, porque não queremos agir. Enquanto existir esta atitude de espera, haverá cada vez mais luta, cada vez mais sofrimento, falta de compreensão; a vida se torna uma tragédia, uma coisa sem valor. Ao passo que se vocês agirem voluntariamente como indivíduos, porque querem compreender e descobrir, então vocês se tornarão responsáveis, não se tornarão reformadores, então haverá uma mudança completa, não baseada em possessividade, em diferenças, mas em verdadeira humanidade em que na qual há afeto, há pensamento e, portanto, êxtase de viver.

28 de março de 1934