Trecho da palestra em Alpino 04/07/1933

Sabem, a maioria de nós quer adquirir sabedoria ou verdade por meio de outra pessoa, através de alguma agência externa. Ninguém pode convertê-lo num artista; somente você próprio pode fazê-lo. É isso que quero dizer: eu posso dar-lhe tintas, pincéis e telas, mas você mesmo terá que se tornar o artista, o pintor. Eu não posso transformá-lo em um. Agora, nas vossas tentativas para se tornarem espirituais, a maioria de vocês busca professores, salvadores, mas eu afirmo que ninguém no mundo pode libertá-los do conflito do sofrimento. Alguém lhes poderá dar os materiais, as ferramentas, mas ninguém lhes pode dar aquela chama da vida criativa. 

Vocês sabem, nós pensamos em termos de técnica, mas a técnica não vem em primeiro lugar. Primeiro você tem que ter a chama do desejo, e então a técnica segue. Mas, dirá você: “Deixem-me aprender. Se me ensinarem a técnica da pintura, então serei capaz de pintar”. Existem muitos livros que descrevem a técnica da pintura, mas apenas aprender a técnica nunca fará de você um artista criativo. Somente quando você estiver inteiramente só, sem técnica, sem mestres, só então poderá encontrar a verdade. 


O voo da águia 

KRISHNAMURTI: Senhor, por que pressupomos tantas coisas? Não se pode fazer uma viagem e examinar, não sabendo nada? Uma viagem dentro de si mesmo, não sabendo o que é bom ou mau, o que é certo ou errado, o que deveria ser, o que deve ser, mas apenas fazer a viagem sem qualquer peso? Esta é uma das coisas mais difíceis, viajar dentro de si mesmo sem nenhum sentido de peso. E, ao viajar, você descobre – não diz no início: “Isto não deve ser assim”, “Isto deveria ser”. Pelo visto, essa é uma das coisas mais difíceis de fazer, não sei por quê. Vejam, senhores, não há ninguém para lhes ajudar, incluindo o orador. Não há ninguém em quem ter fé, espero que você não tenha fé em ninguém. Não há nenhuma autoridade para lhe dizer o que é ou o que deveria ser, dizer para caminhar em uma direção e não em outra, ter cuidado com as armadilhas, tudo marcado para você. Você tem que caminhar sozinho. Pode fazer isso? Você diz: “Não, porque tenho medo”. Então pegue o medo, entre nele e o compreenda completamente. Esqueça a viagem, esqueça a autoridade, examine toda essa coisa chamada medo – medo por não ter ninguém em quem se apoiar, quem possa lhe dizer o que fazer, medo de que poderia cometer um erro. Cometa o erro e, ao observá-lo, você saltará instantaneamente para fora dele. 

Descubra à medida que avança. Há nisso mais criação do que no pintar, no escrever um livro, no subir em um palco e fazer papel de macaco. Há maior — se posso usar esta palavra —excitação, um senso de maior…