Giddu Narayanan

EDUCADOR, VALLEY SCHOOL, BANGALORE, ÍNDIA

 

EB: Você contou uma história na qual Krishnamurti relatou algo que chamaram de milagre. Poderia nos contar sobre isso?

GN: Anos atrás eu estava caminhando com Krishnaji pela praia em Madras. Foi por volta de 1959. Enquanto caminhávamos, perguntei a ele sobre milagres e o que ele pensava sobre o assunto. Ele disse, “Te contarei uma anedota”. Ele contou que um homem havia o procurado e pedido que ele ajudasse sua esposa. Sua perna havia sido severamente fraturada e havia algo crescendo entre duas juntas, que não podiam ser operadas. Assim, seria necessário amputar a perna dela na altura do joelho. Então Krishnaji disse, “O que eu posso fazer? Se quiser, pode trazer sua esposa”. Então, no dia seguinte a esposa foi levada ao escritório dele, carregada em uma maca. Ela estava chegando quando Krishnaji saiu de seu quarto, e ela o viu. Seus olhos se encontraram, e assim ela se levantou e saiu andando. Essa é a anedota. Krishnaji se voltou para mim e disse, “Rapaz, eu pensei que eles estivessem brincando comigo”. Então eu fiquei em silêncio. Pensei que talvez fosse uma piada. Então ele disse, após um tempo, “No dia seguinte, de manhã, a filha deles veio com uma guirlanda e disse, “Você sabe o que fez pela minha mãe? Foi um milagre”. Havia um grande senso de humor no modo como ele disse isso. Então eu perguntei a Krishnaji, “Foi porque ela tinha fé em você?” Ele respondeu, “Não, esse não foi o motivo”. “Então, como isso foi possível?” Eu perguntei. Ele disse, “Em algum lugar, alguma coisa mudou”. Então eu questionei novamente, “O que é isso que muda?” Ele disse, “Energia. A energia passa.” E assim a conversa acabou. Krishnaji era muito modesto quando conversávamos sobre seus poderes de cura. Porém, ele fez um comentário muito interessante, ele disse, “Curar o corpo é uma questão simples. Um bom médico pode fazer isso. Mas curar a mente é muito mais profundo e grandioso. Curar a mente da mágoa, do medo e da solidão requer grande atenção e profundidade.” Assim, Krishnaji não queria que seus amigos falassem de seu poder de cura porque essa não era a função dele. Sua principal missão, se pudermos chamar de missão, era curar a mente. E isso vem claramente porque o principal objetivo de seus ensinamentos é libertar o homem incondicionalmente.

EB: Você disse que Krishnaji se comunicava mais através do silêncio, talvez, mais do que de palavras. Como você explica isso?

GN: Krishnaji era um grande expoente do diálogo através de palavras e refinamento da comunicação. Porém, era preciso conhecê-lo pessoalmente para compreender a natureza da quietude, porque se você saísse para fazer uma caminhada com ele, seria muito difícil fazer qualquer pergunta. Era possível vivenciar uma qualidade de silêncio, beleza e compaixão, e é difícil separar uma da outra. O questionamento, o silêncio e a observação caminham juntos, e era possível observar a personificação dessas qualidades em Krishnamurti na maneira como ele falava e vivia.

Em 1970, Krishnamurti retornou novamente à Índia após se ausentar por dezoito meses, embarcando nas habituais rodas de conversas, diálogos e conferências. Diferente do que havia feito nos anos anteriores, ele não pôde ficar lá devido a uma disputa legal acerca da propriedade de Vasanta Vihar em Madras, resultante do caso Rajagopal. As discussões em andamento entre o Procurador Geral adjunto da Califórnia e a outra parte ainda não haviam chegado a um desfecho. Rajagopal não estava interessado em um acordo.

Em março de 1970, Krishnamurti falou no Auditório Cívico de Santa Monica, que comporta três mil pessoas, e centenas tiveram que ser rejeitadas. Sempre houve aqueles que deixavam o auditório em meio às palestras, ofendidos por algumas observações particularmente desafiadoras sobre nacionalismo, religião ou muitas outras coisas que prezamos. Isso aconteceria inevitavelmente em qualquer país em que ele estivesse, fosse na Índia, com seus modos profundamente arraigados e tradicionais, fosse na Europa, nas reuniões internacionais de Saanen, ou nos Estados Unidos, onde uma maré crescente de fundamentalismo trouxe respostas irritantes e exigentes em algumas das palestras.

Um alinhamento que parecia estar acima dessas interpretações limitadas foi o do grupo psicoterapêutico na moda nas décadas de 1950, 1960 e 1970.

David Shainberg foi um membro distinto desse grupo psicoterapêutico. Decano do Programa de Treinamento Especializado em Medicina Psicanalítica do Centro de Pós-Graduação em Saúde Mental de Nova York, autor de The Transforming Self e vários artigos profissionais, ele se engajou em vários diálogos prolongados com Krishnamurti, alguns dos quais foram gravados em vídeo. A série A Transformação do Homem com Krishnamurti, o professor David Bohm e o Dr. Shainberg, foi especialmente notada.

Neste artigo escrito para o boletim de verão da Fundação Krishnamurti, ele escreve sobre esta importante reunião.